Tuesday, June 27, 2006

“...Mas nada vai conseguir mudar, o que ficou...”

Cena 1: Eu ao telefone...
Cena 2: Filhos brigando porque um invadiu o MSN do outro, respondendo pelo outro a um terceiro que, sem saber que a resposta era do um, combinou com o outro algo que o um respondeu... Entendeu?
Cena 3: Um brigando comigo porque eu não tinha dado bronca suficiente no outro...
Cena 4: Eu (a quarta pessoa dessa história) ainda ao telefone. Parei por um segundo para “apreciar” a cena bizarra de dois adolescentes, quase adultos, se estapeando e falando impropérios um ao outro... enquanto o outro (o quinto elemento dessa narrativa) que estava do lado de lá do telefone “ouvindo” meu silêncio, perguntava o que estava acontecendo... E eu: meus filhos se matando, acredita? E ele riu...
Desliguei o telefone e fui tentar resolver a situação...
Fim da novela.
Hoje de manhã, quando acordei, ainda pensava nisso... Lembrei-me de mim e deu meu irmão. Como brigávamos na adolescência. Nossa! E só na adolescência, porque na infância simplesmente fingíamos que não nos conhecíamos. É verdade... Eu nem tenho muitas lembranças de meu irmão de quando éramos crianças. De vez em quando até falamos sobre isso.
Ele simplesmente não fez parte dessa fase da minha vida. E, se fez, foram tão raras suas aparições que nem foram computadas pelas minhas memórias. Talvez um ou outro lance, de relance... Eu não sei se eu fazia questão de o ignorar ou se ele era quem fazia, se era ciúme um do outro, ou sabe-se lá... Sei que o um passava pelo outro, como se o outro fosse invisível para o um...
Bem, isso na infância... Mas na adolescência... Pelo amor de Deus! Meu irmão era insuportável! Daqueles irmãos típicos mesmo, que faziam de tudo para irritar a irmã mais nova, e depois com a cara mais lavada do mundo se fingia de bonzinho. E minha mãe acreditava! Isso é que era o pior. E ainda acrescentava: “essa menina era tão doce quando criança e agora adolescente é assim, toda rebelde, não pode nem encostar”.
Que ódio eu sentia! E depositava todo esse sentimento nele, em meu irmão, claro. Quanto mais ele me irritava e minha mãe achava que eu é quem era a rebelde, mais eu me rebelava e me tornava rebelde mesmo. Quase nos matávamos. E engraçado é que ele sabia exatamente meus pontos fracos, minhas inseguranças, meus complexos. E era bem aí onde atacava...
Aos poucos o tempo foi passando. Foi morar fora. Começou a se transformar em meu melhor amigo... Talvez justamente porque já não dividíamos o mesmo teto, ou porque tínhamos crescido mesmo... As brigas continuavam. Mas eram menos. Bem menos. No lugar, de vez em quando, aparecia um irmão todo bobo quando alguém me elogiava.. Às vezes eu me achava feia, ainda cheia de complexos. E quem me exaltava? Meu irmão...Vinha me contar em detalhes que fulano ou fulana tinha dito isso e aquilo sobre mim... Fazia-me sentir uma verdadeira modelo...
Nessa época, eu adorava usar saias curtas (bem, confesso que ainda gosto...) Meu avô não deixava eu usar, e minha mãe, sempre tentando apaziguar, não sabia se atendia aos meus pedidos ou se obedecia ao meu avô... Então, quem me socorria? Meu irmão, que vivia me defendendo. “Tá na moda”. E me presenteava não só com as saias que eu via nas vitrines, como gastava quase metade do salário dele em presentes pra mim... Tinha orgulho da irmã “modelo”... E eu desfilava pelas ruas, nas festas, nas reuniões em família; era praticamente uma Gisele (ou uma Luíza Brunet, se levar em consideração a época... ai ai)...
Meu melhor amigo até hoje. Brigas? Raríssimas. Tão raras que nem são computadas pelas minhas memórias...Memórias que só guardam coisas boas. Sempre. Dele, dos meus filhos, das pessoas que fizeram parte da minha vida... Até das defesas de minha mãe em relação ao meu irmão na adolescência, tenho como lembranças boas... Fazem-me retornar a uma época que, infelizmente, jamais voltará. E me lembro da casa cheia, das pessoas, das festas, dos churrascos, das visitas, das reuniões, dos cheiros... de um tempo em que “a gente chegou a acreditar que tudo era pra sempre, sem saber que o pra sempre, sempre acaba...”
Hoje, sei que eu e meu irmão jamais voltaremos a nos ignorar na infância, jamais voltaremos a brigar na adolescência, com minha mãe no meio defendendo a paz no lar... Jamais meu avô chegará dizendo que não quer me ver andando sozinha na rua ou que achou minha saia muito curta... Jamais haverá aqueles churrascos, aquelas reuniões...Tanta coisa jamais acontecerá... Pois é...

Um dia, jamais Amanda e Mateus voltarão a protagonizar cenas como as de ontem... Um dia, jamais brigarão porque um invadiu o MSN do outro e o um respondeu pelo outro o que o outro não pensava dizer ao terceiro...
Quanto ao terceiro, o que estava do outro lado do MSN... Bem, ele também jamais saberá que, sem querer, também presenciou algo que um dia jamais voltará a ocorrer... Que pena... : -/


(Adriana Luz - * Hoje tem jogo do Brasil - Brasil X Gana - depois escrevo sobre isso)